A investigação acerca da PHYSIS - um questionamento que tem origem no mundo grego - ressurge em minhas obras em decorrência da percepção de uma necessidade contemporânea. Daí, não constitui um objeto que se fixa naquele passado remoto, mas deve sim, ser compreendida sob outra luz que a que lhe originou, no entanto, sem perder de vista a atemporalidade que as noções gregas alcançaram. 

Contemporaneidade, nome de um tempo em que a distância entre o homem e a natureza aumenta perigosamente, crise aparentemente intransponível, seja a do convívio com o meio ambiente, ou (o que é muito mais grave) com a própria natureza humana. Visão subordinada a poderes temporais gigantescos, transformando o homem num autômato, destituído de sua identidade natural. Ser homem, segundo este paradigma restrito a interesses imediatos, resume-se naquilo que convém a modos estranhos ao espírito, apartando o homem de si mesmo para que haja apenas em favor de convenções efêmeras. 

Contudo, esta vontade de poder, de dominação, é latente à humanidade sem dúvida, mas manifesta-se sob formas distintas quando nos movemos no tempo percorrendo as diferentes culturas. Assim é que, na vida dos povos ancestrais, e dos indígenas, sobretudo, podemos reconhecer valores naturais, nos quais, a intimidade com o meio ambiente e a afirmação da ação humana sobre ele, são partes complementares de um só propósito harmônico. Deste modo, toda criação, isto é, toda obra humana, decorre desta apreensão, das relações espirituais que o homem mantém com o meio exterior, constituindo um “todo” indissolúvel, em que o objeto criado, seja qual for sua forma, seu fim ou sua gênese, esplendem por si mesmos, a explicação e justificativa de sua natureza na natureza humana. A partir deste “modo harmônico” irromperam as grandes pirâmides e os colossos em rocha que povoam o mundo atravessando as eras para testemunhar a possibilidade de integração do homem com o Cosmo. 

Trata-se de um “modo harmônico de conceber o ser”, um olhar desobstruído de intenções fúteis, e que sustenta-se na idéia de um Cosmo perfeito, repleto de significado, aonde o homem não é “senhor da natureza”, mas sim, uma forma viva nela, um ser manifesto num tempo e espaço determinados, reflexo de causas que estão absolutamente acima de suas capacidades explicativas , mas que nem por isso, subtrai a necessidade  do elo com sua origem.  Falamos aqui, do homem num tempo mítico, Universo prenhe de poderes e encantamentos, de um mundo infinitamente vasto e paradoxalmente completo, que abriga o que é mais do que o mero possível e impossível, o palco por excelência da Odisséia Humana desocultando os mistérios deste Universo na consumação de seu próprio destino: ser este descobrir-se Um com tudo o mais.  

A PHYSIS, do grego, é o nome que sintetiza esta ideia sobre a natureza última das coisas, aquilo que corresponde ao que é essencial e imutável, e por isso, o que se mostra como questão inevitável para sanear a mente contemporânea. De outro modo, não há sequer a chance de termos consciência do que ainda nos orienta o sentido interno deste movimento do “vir a ser”, ou seja, a Vida em vista de si mesma. Isto é o que de fato confere inteligibilidade às ações, é aquilo a partir do que podemos nos reconhecer como entidades em processo evolutivo, e posteriormente, como os agentes da consumação desta Causa do Ser. A isto, à PHYSIS portanto, corresponde a noção identitária primária de tudo o que existe.

Intuitivamente, reconheço neste tema, o elo que permite o trânsito entre as culturas ancestrais do Brasil e a filosofia grega - uma espécie de síntese entre a razão intuitiva ocidental e a inspiração criadora dos povos ancestrais. 

Se a tentativa de encontrar fatores comuns em ambas visões de mundo parece mera ação retórica ou insólita, talvez... e se isso requer uma arbitrariedade que beira a insensatez do ponto de vista da investigação científica, é porque na Arte este propósito encontra seu meio perfeito, pois a Arte é o campo para o extraordinário. O terreno onde as sementes já são em si mesmas, a árvore que as originou. E neste tempo de agora, é preciso de extensões legítimas dessa ação constitutiva natural, ações que avancem sobre o que é improvável e inefável. Segundo nos diz Sto. Agostinho, entre outros: quem busca conhecer o inefável deve procurar de modo inefável. O mistério não pode ser explicado, e não precisa ser, é isso o que se pretende. Assim, é no domínio extra-lógico, neste campo indefinível, onde a Arte é plena, que uma investigação de tal ordem pode ter curso livre dos métodos fechados da razão instrumental.

Esta é uma decisão que tem seu ônus, é claro. 

Por que investigar tal questão se não há como chegar a resultados explícitos? 

Mas também, por que não o fazer?

Estamos assim diante da renovação a que Platão reivindica o estatuto do conhecimento possível à mente: despir a Alma do véu que a separa de si mesma como uma reminiscência do Ser Uno que era antes de manifestar-se no tempo. 

Não há maior questão, do que a própria necessidade de questionar. 

Esta é a verdadeira natureza do caminho aqui proposto.

 

BREVE APRESENTAÇÃO DOS PROJETOS QUE CONVERGIRAM DESTA VISÃO 

 

1987 – O SER HUMANO E SEUS MOVIMENTOS/ DANÇA TRANSCENDENTAL

1988/89 – PAISAGEM INTERIOR

1990/97 – CIVILIZAÇÕES

1998/1999 – CORAÇÃO SUL AMERICANO

2000 – A COR DO BRASIL

2001 – PHYSIS

2001/04 – DANÇA PARA SEGURAR O CÉU

 

PHYSIS EXPOSIÇÃO 2003

 

Exposição de aquarelas concebidas a partir da leitura dos textos filosóficos dos Pré – Socráticos. A mostra ocupou o hall central do Departamento de Filosofia da Universidade de São Paulo, e teve a apresentação da filósofa Olgária Matos. O objetivo da mostra foi colocar as imagens à disposição dos participantes do VII Encontro de Pesquisa na Graduação em Filosofia, como um evento paralelo: a obra de arte como objeto de reflexão acerca dos problemas da representação pictórica como discurso filosófico válido.